Os dois Portugais
Há dois países neste nosso Portugal:
- um é "o país de todos nós", é o país governado pelo governo, é o país cujo orçamento tem uma estimativa de défice de 6,83% antes de qualquer acção governativa para o reduzir, o país cujos cidadãos vão ter que suportar novas agruras por causa desse défice, o país que vem suportando agruras por causa do défice, o país que não é capaz de crescer economicamente;
- o "outro" país é o das autarquias locais, das câmars muncipais, das juntas de freguesia, da áreas metroplitanas. Este país nada tem a ver com o primeiro, se bem que viva à conta da contribuição predial ou Imposto Municipal sobre Imóveis (pago por todos nós, nós que também vamos ter que sofrem as medidas draconianas por causa do défice) e das transferências orçamentais (do orçamento deficitário, suportado por todos nós) e das licenças e taxas de urbanização (pagas pelos seus munícipes que também pagam para o défice) e de outras corveias e receitas, e dos empréstimos.
Ainda assim, esse país das autarquias locais, da câmaras municipais, não tem nada a ver com o "outro", o do défice, nem com o défice dele, e menos ainda com as medidas correctivas que lhe possam implicar qualquer restrição. Isto porque não foi ele que deu origem ao défice; o défice é originado apenas pelo governo do "outro" pais. Já manifestou essa posição através da sua estrutura "sindical" e de "lobying", a Associção Nacional de Municípios. A comissão Constâncio "não foi fora disso", e não se debruçou sobre matéria de gastos autárquicos, designadmente o seu endividamento.
Estamos em época pré-eleitoral autárquica e não convém indispor os autarcas. O PS sabe disso. O PSD também. E se não sabia, passou a saber que os autarcas, sua criação, também podem revoltar-se contra o seu partido.
E não há-de tardar, pelo caminho que isto leva, que os lídimos representantes desse poder autárquico se revoltem contra o "outro" país, o do governo, e passem a impor a sua vontade, ou melhor as suas vontades, a esse governo e ao país desse governo, e deixem de se conformar com a governação daquele e passem a seguir apenas a sua própria vontade.
Mas será que para as autarquias locais, para 308 câmaras municipais e 4252 juntas de freguesia, o défice não é com elas, como se vivessem num país diferente daquele que tem um orçamento do estado deficitário?