"Medidas" a toda a hora!
Desde que o défice nos foi finalmente “revelado”, não tem havido dia em que o governo não anuncie nova iniciativa governamental, quer englobada naquilo a que convencionou chamar de medidas destinadas a combater o défice, quer destinada a dar um “retoque” numa circunstância ou efeito colateral dessas medidas.
E a cada iniciativa anunciada, vai-se acentuando a ideia de que toda elas têm um carácter avulso, desarticulado e das quais o governo (e por isso também o senhor primeiro ministro) nem sequer sabe ou projecta, verdadeiramente, os seu efeitos ou consequências.
Assim, perante a invocação ou constatação de um qualquer efeito adverso, não tarda o senhor primeiro ministro surgir a anúnciar nova medida destinada a eliminar tal efeito (mas que mais tarde se verá que provoca outro efeito nefasto, para o qual, o governo, prontamente, anuncia nova medida).
Nesta sequência, se os efeitos da primeira medida não haviam sido estudados e avaliados em toda a sua extensão, no que toca à subsequente medida-remédio, ela nem sequer nunca havia sido pensada, e surgiu unicamente pela necessidade do governo ter que dar uma resposta a uma situação politicamente indesejável. Quanto aos seus efeitos logo se verá; e, se for necessário, “toma-se” outra medida.
Muitas destas medidas (se não todas) hão-de produzir efeito ao nível do ordenamento jurídico. Mas por causa do seu carácter avulso, não só esses efeitos darão origem, como seu inexorável resultado, a uma completa desarticulação dos mecanismos jurídicos e da sua disciplina jurídica, como, simultaneamente, contribuirão para o agravamento da confusão legislativa e do “caos normativo” que reina no nosso sistema jurídico e, em especial, ao nível do direito administrativo.
Exemplo de mais uma medida-remédio, destinada a "compôr" os efeitos indesejados de outra medida, é a hoje subitamente anunciada pelo senhor primeiro ministro de que os reformados quem exerçam funções publicas passam a poder receber apenas 1/3 da pensão de reforma em acumulação com o ordenado integral correspondente à função desempenhado, ou em alternativa, a pensão de reforma integral em acumulação com 1/3 do vencimento correspondente à função desempenhada.
Ora esta medida só surgiu por causa e como resposta à “incomodidade” sentida pelo governo (e pelo senhor primeiro ministro) face ao anúncio (que o senhor primeiro ministro classificou, desabrida e inusitadamente, de “assassinato de carácter”) de que o senhor ministro das finanças recebe uma pensão de reforma que acumula com o vencimento de ministro.
Se não fosse essa notícia e a incomodidade que ela provocou no governo, este não teria tomado esta medida. Mas dá a nítida sensação que a anunciou sem sequer pensar nos efeitos subsequentes. Tomou-a apenas porque era necessário dar uma resposta a uma situação incómoda; e tomou esta medida como poderia ter tomado uma qualquer outra.
Veremos, daqui a algum tempo, quando começar a ser publicada a legislação que incorpora esta e todas as restantes medidas e contra-medidas, o completo “caos” que irá provocar.