Os galegos
Os senhores da água, os galegos, merecem uma nota que os separe dos que aparecem sempre na sua companhia, como negros, mulatos, mouros, etc.…Por duas razões: porque em finais do século XVIII já eram 60 000, número considerável em relação à população de Lisboa, e porque a sua acção foi importante na história da alimentação da cidade, tão importante que essa acção chegou aos nossos dias transmitindo usos que se transformaram em emblema da cidade como, por exemplo, as populares «iscas com elas». Era gente forte, muito robusta, preparada para trabalhos pesados, que tinham como característica principal serem muito económicos. Não se metiam em brigas, e nunca eram tidos como culpados de qualquer roubo ou qualquer crime. Eram orgulhosos e desembaraçados e raramente ofereciam os seus préstimos, aguardavam que alguém os pedisse. Os galegos em Lisboa eram vendedores de água, moços de frete de corda ao ombro, moços de lojas e armazéns, criados de hospedarias e casas particulares, cocheiros, trintanários, varredores de ruas e empregados das tabernas e casas de pasto. Foi nesta actividade, e na de aguadeiro, que se tornaram conhecidos e que se enraizaram na cidade. Trabalhavam muito, viviam economicamente e depois de juntar algum dinheiro partiam para as suas terras e compravam um terreno. Em 1801 houve uma tentativa de os expulsar por causa da guerra mas o Intendente Geral da Polícia avisou que, expulsando-os deixava de haver quem servisse a cidade. Foram deixados em paz e continuaram. Em relação aos criados portugueses, mais subservientes, os galegos eram mais orgulhosos, mais limpos, mais fiéis e mais sóbrios. Quando chovia e a lama deixava as ruas da cidade em estado lastimável, eram eles que carregavam as pessoas. Os que vendiam água iam encher as suas barricas decoradas aos chafarizes e depois apregoavam a «áááágua freeesca, frisquiiinha, quem quer beber áugua freeesca?» Vendiam cada copo de água a 5 réis.