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Pharmácia de Serviço

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Corrupção e "ética republicana"

Regularmente entra na moda um tema, motivo de discursos oficiais, de intervenções políticas, de comentário jornalístico, de conversa quotidiana e, fundamentalmente de “distraidor” de consciências.

Na verdade o surgimento desse tema – geralmente controverso, mas de forte incidência social – serve não só para “trazer à luz do dia” um dado problema social e/ou político, na busca da sua solução, mas fundamentalmente, na medida em que ele é “publicamente” “revelado” – e portanto deixa de ser um “tabu”, falado em surdina ou, tão somente, sem uma notória repercussão social – serve de lenitivo para uma chaga que todos sentem mas de que ninguém quer verdadeiramente contribuir para a cura.
Assim denunciado por alguém com peso social, o problema, conhecido de cada um, passa a ser problema de “alguns” – exactamente os que venham a ser “encarregados” de, para ele, encontrar remédio ou solução.
Mas mais do que isso, o problema deixa imediatamente de pesar na consciência individual e passa a pesar na consciência colectiva – o que deixa de ser um problema de cada um! Ou seja, um alívio … mas nunca um remédio.

De mais a mais, há certos problemas sociais que têm como causa uma “crise de valores” – são problemas de cariz subjectivo quer social que individualmente.
Do que resulta que sem uma adesão individual e social aos valores postos em crise, todas as medida correctivas que se intentem adoptar serão sempre “exteriores” à causa do problema, impostas mais ou menos coercivamente, perante as quais a indiferença ética leva enorme vantagem por mais “fácil” e porque, não obstante toda a critica e censura, esses problemas são ainda socialmente aceites – são, ao fim e ao cabo o “espírito da época”, aquilo a que parece ter conduzido a evolução natural da sociedade e, por isso, a coisa mais normal do mundo.

Portanto corrigir problemas de ética sociais com medidas que não passem pela adesão e reconhecimento pela comunidade e por cada um dos indivíduos desses mesmos valores éticos é o mesmo que “chover no molhado”.

Vem tudo isto a propósito do discurso – agora em voga – do “combate à corrupção”.
Dito como se apresenta nos discursos oficiais e nas manifestações de concordância (aliás emitidas pelos próprios visados, com o maior despudor…), esta perece ser uma questão de criação de “bombeiros anti–corrupção”.
Criados estes, passarão a fazer vigilância na “mata social”, sempre atentos ao surgimento de focos de corrupção e sempre que eles surjam, lá irão eles deitar umas mangueiradas de valores, de reprovação ética e de punição social, apagando o foco e fazendo o rescaldo de mais uma vigarice ou desonestidade.
Feito isto, a sociedade – que permanece “de fora” de toda esta actuação – “adormece” de novo “em segurança” e de consciência tranquila – até à próxima …

Ora o combate à corrupção não se trava – e principalmente não se trava só – combatendo a corrupção.
Trava-se antes de mais – e fundamentalmente – prevenindo ou evitando a corrupção, através da existência de um conjunto de valores de éticos e morais, reconhecidos, aceites e defendidos pela comunidade, nos quais todos os cidadãos se revêem e a luz dos quais pautam as suas acções. E caso eles sejam violados, aí a censura e a punição social far-se-á sentir – “combatendo” então essa condutas “desviantes” e violadoras dos valores comunitários.

Estes valores não são nada de novo: pode dizer-se mesmo que são “tão antigos como o mundo”. Não era preciso agora vir invocar a “ética republicana” para encontrar os “bons valores” – como se a república fosse a única e fiel depositária dos “bons valores” e antes dela ou para além dela, as demais éticas não fossem “boas” ou portadores de valores tão elevados como os da república.

Aliás não se percebe exactamente o que seja a “ética republicana” e em que é que ela se distingue da “ética monárquica” (perante a qual aquela se arrogou sempre de maiores e melhores valores …).
Talvez que a dita “ética republicana” tenha, isso sim, assento na “ética maçónica”. Mas o que é que esta diz que não digam já todos quantos desde a antiguidade clássica dissertaram sobre ética? Que valores diferentes e inovadores defende esta que não tenham já sido propostos desde os gregos? O que diz a “ética republicana” que não tenha dito antes a ética e a moral cristã?

Pois bem; o combate à corrupção passa pois pela existência de valores éticos e morais, reconhecido e voluntariamente aceites por todos.
Para isso é necessário uma “cartilha” de valores aceite pele sociedade, à luz da qual se pautará o comportamento dos adultos.

Porém isso não basta ou é manifestamente incapaz de conduzir a resultados visíveis. Não é em adulto que se “aprendem” valores. Podem melhor “apreender-se” em toda a sua real dimensão, mas eles vão-se aprendendo e interiorizando desde que se nasce.
Portanto, ou se transmitem valores aos jovens, desde o berço, ou qualquer combate à corrupção falhará estrondosamente. E, ao mesmo tempo, ou todos os adultos entendem, aceitam e pautam as suas condutas pelos valores dessa “cartilha” ou nunca nenhum combate será bem sucedido.

O problema é que, de há uma trintena de anos a esta parte, a invocação da “liberdade” foi o argumento para destruir todos os valores que para além nas normas penais sancionatórias, ordenavam a sociedade. Invocando a “liberdade” e o princípio de que “o que não está proibido é permitido” entrou-se numa espiral delinquente de “chico – espertismo” que se confundiu, e pior, se incentivou sempre, como se isso fosse “espírito de iniciativa”.

E à medida que se iam desagregando os valores ditos “tradicionais” da honestidade, da honorabilidade, da verdade, do respeito pelo próximo, do respeito pela propriedade alheia designadamente pelas coisas do Estado (ou seja, pela res publica), entendia-se que o dito “espírito de iniciativa” não tinha “margens” nem “barreiras”, nem estava sujeito a outros limites que não fosse a capacidade de invenção e de “desenrascanço” para se atingir os objectivos, fossem eles quais fossem. Os fins passaram a justificar os meios.

Tudo o que dantes tinha balizado comportamentos passou a ser apodado de “fascista” ou e “reaccionário”; e quem defendia tais valores, além de deixar de ser considerado “um gajo porreiro”, era um “reaccionário fascista”, “inimigo do progresso” (ou mais modernamente uma “força de bloqueio”), merecedor de todos os epítetos – para além de uma evidente e ostracizante “reprovação social” …!!!

É claro que este novo estado de espírito e estes novos valores “atacaram” quem mais de perto contactava com os assuntos públicos – os políticos. As mais das vezes saídos de “luras”, ávidos de poder e de consideração social, teceram teias de interesses e negócios mais que obscuros, à procura de dinheiro, que sempre associaram a ascensão, importância e poder.

Mas o resto da sociedade que se não ria: não foram só os que dedicaram à política que foram contaminados por esta pecha. Toda a sociedade, designadamente uma classe ascendente – onde se misturavam “comerciantes”, “empresários”, “investidores”, “industriais”, profissões liberais, dirigentes associativos, e quejandos – ávida de dinheiro e da obtenção de um estatuto social que costuma observar nas classes possidentes, não olhou a meios para atingir os seus fins. É evidente que grande parte dessas personagens conseguiram o dinheiro e a riqueza que tanto almejavam; será duvidoso porém que, só por isso, alguma vez tenham chegado ao estatuto social das ditas classes possidentes.

Ou seja todos os que procuravam poder ou dinheiro e todos os que estavam, de alguma forma no caminho desse poder ou do dinheiro, entraram neste vórtice da dita “corrupção”.

É evidente que houve e há excepções. Porém as excepções servem exactamente para confirmar a regra.
Mas se for encontrado alguém nunca pediu ou utilizou um “favor”, nunca tenha dado ou recebido uma “gratificação” ou uma mera “prenda”, nunca tenha fechado os olhos a uma situação de corrupção ou de “compadrio” que lhe tenha passado escandalosamente à sua frente sem a evitar ou denunciar, podemos então gritar, como o sábio grego: “Eureka”!
Na verdade, a dignidade tem um preço cada vez mais elevado – está mesmo, pode dizer-se, “pelas horas da morte” …!!!

Ora, se honrássemos pai e mãe – seríamos pessoas honradas, pois eles o terão sido também. E sendo honrados, os nossos filhos, educados nos mesmos valores, honrados seriam.
E, por isso, se não nos vissem matar – e se os ensinássemos que não se mata porque a vida é um valor sagrado ou “fundamental” – eles não matariam.
E não nos vendo furtar – e se lhes ensinássemos que o respeito da propriedade alheia é um valor fundamental da sociedade, porque pacificador – os nossos filhos não furtariam. E não furtariam apenas não roubando; não furtariam também não obtendo mais do que o seu direito permite nem obtendo ilegalmente aquilo que lhes não é devido.
Não levantando falso testemunho permitiríamos que a verdade vingasse. E sendo verdadeiros e ensinando aos nosso filhos que a verdade é um bem inestimável, ele seriam verdadeiros e honestos consigo e para com os outros.
E se não cobiçássemos as coisas alheias, antes procurando legitimamente ganhá-las com trabalho honesto e esforçado – com o “suor do rosto” e não com expedientes e corrupções e compadrios – seríamos um exemplo para os nossos filhos. Que aprenderiam que o trabalho é um valor essencial da sociedade, que é árduo e penoso, mas que só ele permite ir mais longe, mais alto e mais além.

Porque é que nos esquecemos de tudo isto e agora, perante a iminência da derrocada social, vimos invocar a “ética republicana”?
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