Coragem e clarividência
Depoimento de Jaime Nogueira Pinto sobre o 25/4, no DN:
E depois, na Rua Nova do Almada, gente a partir as montras de um minimercado e a roubar coisas. Democracia à portuguesa.
Também achei curioso – e vergonhoso – ver os locutores da RTP que, na véspera, glorificavam Tomás e Caetano, a ler com renovado zelo e satisfação as notícias do dia.
Ao contrário de muitos neodemocratas, não era partidário ou ligado ao regime que caía, mas estava contra aquilo que chegava.
Na democracia de Abril havia presunção de perigosidade e de culpa.
O que de positivo trouxe o 25 de Abril? Pessoalmente, deu-me a possibilidade de testar a minha coerência e de pagar pelas minhas convicções.
Vivi quatro anos exilado com a família e sobrevivi sem negar nem renegar nada, e sem aceitar facilidades do novo regime.
O que devia mudar e não se muda, nem em democracia nem em regime nenhum: a cabeça de algumas pessoas, desta classe político-burocrático-empresarial de gente medíocre e habilidosa, ora espertalhona, engraçada e brincalhona, ora séria, empertigada e solene. É essa a grande força de bloqueio, a burguesia ‘aparatchique’ de serviços e concertos, adaptada e adaptável a tudo, que por aí anda e manda – nos partidos, nos media, nas universidades.
A única revolução que valia a pena era a dos “espíritos”, a das cabeças.
Portugal precisa de imaginação, trabalho, responsabilidade. E que quem mande seja patriota, honesto, tenha alguma inteligência, sentido do bem público, senso comum e humildade.